Artigo

Fraldas e mamadeiras

Naquela tarde ao receber a notícia Luís teve a maior decepção da sua vida...

Naquela tarde ao receber a notícia Luís teve a maior decepção da sua vida.
Instantaneamente as lembranças do passado lhe invadiram.
Viu-se na ala infantil do hospital com uma emoção tão grande que fazia com que, em seu rosto, ostentasse risos e lágrimas.
Lembrou-se das vezes que cantou para ela dormir.
Das fraldas que ajudou a trocar.
Das mamadeiras que carinhosamente preparou.
Do orgulho que teve quando ela deu os primeiros passos. Das primeiras palavras que ouviu quase impossíveis de se entender. Engasgou ao ouvir algo parecido com “pai”.
Dos dias que mesmo sem dormir, enfrentava com alegria e só esperava a hora de retornar e curtir aquele encanto. Sentia, a cada minuto, uma forte “saudadinha” dela.
O primeiro dia que a levou à escola. A tristeza que sentiu ao se despedir e ver aquele rostinho tão meigo quase que implorando para não ficar sozinha ali. Precisava ser forte e parecer natural.
Deixou para chorar ao se afastar.
Que dor incalculável sentiu no coração.
De tanto que a queria bem, nunca permitiu que fosse feita nela sequer o teste do pezinho nem as vacinas obrigatórias. Não admitiria de maneira nenhuma que maltratassem sua pequena.
Vê-la superar cada fase da vida era tudo o que queria. Tinha muito amor por ela. Nunca escondeu isso. Contava para os amigos cada fato novo. No rosto trazia o encantamento típico de pai apaixonado.
Quando nasceu o primeiro neto orgulhou-se ainda mais. Foi feliz. Amou demais aquela filha.
Contudo agora a situação era outra.
Vê-la dominada brutalmente pelos enfermeiros até adormecer com o medicamento aplicado machucava até a sua alma.
Onde ficou aquela pessoa meiga, linda e amável?
Olhava para a maca e sentia certa revolta, mas ao vê-la com a cabecinha inchada e cheia de hematomas o maior sentimento, ainda era, de amor.
A vontade de ajudá-la prevalecia. Contudo, agora não dependia mais dele.
O diagnóstico sairia no dia seguinte.
Ao anoitecer voltou para casa. Novamente ela o fez não dormir. Mas desta vez foi por preocupação e tristeza. Talvez a pior noite que passou acordado.
Fechou os olhos e ouvia os gritos e os sorrisos dela quando menina. Chegava, em seus devaneios, a vê-la correndo e pulando para o abraço.
Que saudade sentia. Tempos bons.
Inesquecíveis.
Pôs-se instintivamente a rezar.
Deus o atenderia. Tinha certeza.
(Interlúdios)
 

Escrito por:

MOACIR LUÍS ARALDI

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