Nunca mais
A noite chegava pelas ruas de chão batido ...
A noite chegava pelas ruas de chão batido e escuras tomadas de bares e cabarés. Verdadeiros puteiros amontoados num beco no lado sul da cidade.
Estacionado de forma camuflada sentia-se seguro, protegido e poderoso. Salário recém-recebido e libido generosa davam-lhe fantasias em abundância.
Circunstâncias que o fazia o protagonista de Luzes da Ribalta periférica.
O cheiro de mofo e do ambiente mal ventilado não possibilitava qualquer análise racional.
Uma noite que lhe renderia uma crise financeira para o resto do mês e muitas histórias para contar. Bem mais fantasiosas do que as mulas sem cabeças e Sacis-pererês de fogos e cachimbos.
Ao contá-las dava-lhes requintes de belezas, paixões e lirismo dignos de rebaixar Vinícius de Moraes ao segundo grupo.
Nos anos da Bossa nova e Jazz, comprou sua única guitarra. Dela tirou apenas uma nota e algumas fotos para o porta-retratos emoldurado com madeira e um detalhe dourado.
A glória, agora amarelava sem cordas e sem vocal tristemente pendurada na parede do quarto.
Naquela mesa faltavam Bandolins. Nem Jacob nem Nelson. Certamente não viriam.
Com um pouco de sorte contemplaria Joaquim adentrando com toda sua fama de rei da noite. Aquela, no entanto, era uma provável noite movimentada no Cassino Urca e ele de lá não sairia.
Assim, único festejado pelas garçonetes e prostitutas de pernas de fora e com um perfume repugnante de lavanda, ali beberia os últimos trocados já madrugados.
O prego no pé sempre doía, mas impulsivo, ali estava todo início de mês.
De meretrizes e garotas de programa pensava saber. Bem como o que teria e o que ali deixaria.
Tristes passagens em que a paga lhe era subtraída sem sutilezas. O arrependimento sempre chegava tarde.
Agora, no porão mal iluminado da vida, tinha ainda uma ponta de orgulho que teimava em levantar sua cabeça.
Contudo sucumbia.
As percepções frias da realidade diziam-lhe muito claramente:
Nunca.
Nunca mais.
(Interlúdios)